O ENCONTRO HUMANO À LUZ DA FILOSOFIA CONTEMPORÂNEA


 

 O ENCONTRO HUMANO À LUZ DA FILOSOFIA CONTEMPORÂNEA

Parece-me que o ser humano traz consigo uma necessidade perene — um desejo que não se sacia — de um abraço, de uma atenção especial, de uma entrega que transcenda o imediato. 

Talvez seja saudade, uma saudade grande, quase ontológica: saudade do outro, saudade daquilo que faz de nós mesmos uma realidade inteira.

Martin Buber, ao refletir sobre a relação humana, afirmou que o homem só se realiza plenamente no encontro, quando o eu se depara e se entrega ao tu — não como um objeto a ser utilizado, mas como um ser a ser amado. 

O eu sem o tu não é um verdadeiro eu. Assim, é no espaço intersticial do entre nós que floresce a verdadeira identidade. 

O outro não é um espelho, mas um mistério: sem ele, o eu permanece incompleto, fragmentado.

Até mesmo o ato de vestir um blazer pode parecer acolhedor para quem intui essa necessidade. 

Ele se torna um símbolo: como se o tecido que reveste o corpo fosse também o que reveste a alma no encontro humano. 

 


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A altura ligeiramente erguida por um salto é outra metáfora: não há superioridade nem inferioridade, apenas o nivelamento simbólico, o desejo de se colocar à altura do outro, de habitar o mesmo horizonte.

O abraço, o blazer, o salto — todos eles, em uníssono, denunciam o anseio do saudoso: um sonhador, um cultivador de encontros, um semeador de presenças vividas.

Alguém poderia, talvez, considerar estas palavras poéticas, mas não é poesia o que se intenta; é apenas o voo natural das palavras que se desprendem, como a águia que deixa seu ninho em busca do céu. 

Como disse Gabriel Marcel, a comunicação verdadeira é mais do que palavras — é presença, é doação de ser.

Outros poderiam replicar com certo ceticismo: “Padecer no paraíso”, diriam, evocando a imagem paradoxal da mãe que suporta as dores de uma gravidez de risco — sofrimento que, no entanto, é a antecâmara de uma vida nova.

O desejo de encontro, no entanto, é ambíguo. 

 Ele pode vir mesclado de repulsa, pois há quem tema a alteridade: quem, diante do outro, prefira a reclusão do próprio ego. 

A alteridade implica risco, como bem advertiu Emmanuel Lévinas — o rosto do outro é uma convocação, um apelo, um chamado irrecusável à responsabilidade.

No entanto, quando o encontro é negado, instala-se a mágoa sutil: “Não tenho nada a te oferecer” — ou ainda — “Fiz por você o que você não foi capaz de fazer por mim.” Surge a sensação amarga de um encontro unilateral, um eu que se doa sem reciprocidade. 

Como disse Paul Ricoeur, a verdadeira ética nasce da reciprocidade reconhecida, da mutualidade que respeita a liberdade do outro sem anulá-lo.

Será que o encontro não nos pede nada? Não nos exige um mínimo de entrega? Mesmo o corpo, adormecido e descoberto, pede ser coberto. 

O coração humano também clama por ser revestido, amparado pela presença do outro.

Cobrar: pedir de novo, mas não como um débito, e sim como uma súplica silenciosa. 

E, então, a pergunta se impõe: qual é o sentido de buscar o encontro se sua plenitude depende da abertura mútua?

Maurice Merleau-Ponty nos lembra que a carne do mundo é feita de entrelaçamento: não somos seres isolados, mas entretecemos nossas existências num tecido comum. 

E ainda que o outro possa fechar-se, resistir, negar o encontro, a busca permanece digna — pois, como dizia Gabriel Marcel, amar é afirmar que o outro é insubstituível.

O verdadeiro encontro, portanto, não pode ser exigido, nem cobrado; é dom. Um dom gratuito, livre, pleno — e, exatamente por isso, raro e precioso.

Jean-Luc Marion, por sua vez, nos convida a uma reflexão ainda mais radical: o encontro humano é um fenômeno saturado, isto é, excede qualquer pretensão de controle ou apropriação. 

O outro, em sua alteridade plena, nos ultrapassa; ele não se reduz às nossas categorias, nem às nossas expectativas. 

Ele é dado — pura e inesperada doação. E é nessa saturação que se revela a grandeza do encontro: algo que não se calcula, não se mede, não se explica, apenas se acolhe.

Buscar o encontro é, pois, caminhar na direção do mistério. 

É reconhecer que o entre nós não é conquista, mas graça. 

Não é posse, mas epifania. 

E talvez seja essa a mais bela e profunda verdade: o verdadeiro encontro é sempre um advento — uma irrupção de sentido que nos ultrapassa e nos transforma.

 

 

Padre Joacir d’Abadia,
Filósofo
Autor de vários livros
Especialista em Docência do Ensino Superior
Bacharel em Filosofia e Teologia
Licenciando em Filosofia
Professor de Filosofia Prática
Acadêmico: ALANEG, ALBPLGO, AlLAP, FEBACLA e da "Casa do Poeta Brasileiro -  Seção Formosa-GO"
Contato: (61) 9 9931-5433
Segue lá no Instagram: https://www.instagram.com/padrejoacirdabadia/

 


 

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